Soldado do Exército Brasileiro, filho de ex-policial militar, foi licenciado através de uma Sindicância, na qual teria sido constatada sua incapacidade para o serviço militar, em razão de doença. Ocorre que a Sindicância foi anulada através de ação judicial, e foi determinada a reintegração do militar, pois foi constatado através de perícia a sua incapacidade laborativa para a vida civil e militar. Vejam a r. Sentença, na íntegra:
“0003922-23.2015.403.6105 – L. B. O. V. (SP249588) – PAULO FRANCISCO TEIXEIRA BERTAZINE) X UNIAO FEDERAL Trata-se de ação condenatória, sob o rito ordinário, com pedido de antecipação de tutela, proposta por ……………, qualificado na inicial, em face da União, para que seja reintegrado às fileiras do Exército e receba tratamento médico adequado até sua reabilitação, com percepção dos soldos durante o período de tratamento. Ao final, requer lhe seja prestada assistência médico- hospitalar integral até sua completa reabilitação, o pagamento dos soldos desde a data de seu licenciamento até o efetivo restabelecimento de sua condição de saúde ou, se constatada sua incapacidade definitiva, a adequação à situação pertinente, correspondente à graduação que possuía na ativa. Requer também a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais, no valor mínimo de R$ 78.800,00 (setenta e oito mil e oitocentos reais) e a declaração de nulidade da Sindicância da Portaria nº 64510-006047/2013-32.Alega que, pelo serviço militar obrigatório, cumpriu atividades na Escola Preparatória de Cadetes do Exército, no período de 01/03/2013 a 18/10/2013, quando teria sido licenciado por estar incapacitado temporariamente para o serviço militar.Aduz que teria sofrido humilhações durante os treinamentos, acarretando problemas de ordem psicológica e psiquiátrica e que todo o procedimento administrativo que culminou com o seu licenciamento estaria eivado de irregularidades.Com a inicial, vieram documentos, fls. 28/113.Pela decisão de fls. 116/117 foi indeferida a medida liminar e designada perícia médica. Às fls. 128/232 foi juntada contestação com cópia do processo administrativo. Sustenta a inexistência de vícios procedimentais do ato de exclusão do autor do exército; a regularidade da desincorporação; que quando da publicação da exclusão e desligamento do autor foi mantida a possibilidade de tratamento em Organização Militar de Saúde (encostamento), após a desincorporação até a sua cura definitiva ou estabilização do quadro; que o autor foi licenciado com base em regular procedimento interno por decisão da autoridade competente; que nos autos da sindicância foram observados o contraditório e a ampla defesa e a inexistência de dano moral. Às fls. 247/257 foi juntado Laudo médico. Réplica às 261/279. Manifestação da União juntada às fls. 281.Às fls. 283/286 foi juntada petição do autor. É o relatório. Decido. Reputo maduro e em ordem o feito para sentença, nos termos do artigo 330, I, do CPC. O autor pugna para que seja prestada assistência médico- hospitalar integral até sua completa reabilitação, o pagamento dos soldos desde a data de seu licenciamento até o efetivo restabelecimento de sua condição de saúde ou, se constatada sua incapacidade definitiva, a adequação à situação pertinente, correspondente à graduação que possuía na ativa. Requer também a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais, no valor mínimo de R$ 78.800,00 (setenta e oito mil e oitocentos reais) e a declaração de nulidade da Sindicância da Portaria nº 64510-006047/2013-32.A União, por sua vez, sustenta a inexistência de vícios procedimentais do ato de exclusão do autor do exército; a regularidade da desincorporação; que quando da publicação da exclusão e desligamento do autor foi mantida a possibilidade de tratamento em Organização Militar de Saúde (encostamento), após a desincorporação até a sua cura definitiva ou estabilização do quadro; que o autor foi licenciado com base em regular procedimento interno, por decisão da autoridade competente; que nos autos da sindicância foram observados o contraditório, a ampla defesa e a inexistência de dano moral. Da análise dos autos verifico que o autor foi incorporado às fileiras do Exército Brasileiro em 01/03/2013 como soldado, em face do serviço militar obrigatório e foi excluído em 18/10/2013, após Inspeção de Saúde realizada. Anoto que duas questões se destacam dentre todos os pontos levantados e arguidos, sendo a primeira referente à preexistência da doença e a segunda no tocante a nulidade da Sindicância (nº 64510-006047/2013-32). Com relação à alegação da União de preexistência da doença que acomete o autor entendo ser desprovida de relevância a tentativa de se apartar a ocorrência da incapacidade do autor com as atividades militares, ou seja, descaracterizar o nexo causal, uma vez que o que se apresenta relevante ou crucial é o fato de que quando o autor foi incorporado às Fileiras do Exército encontrava-se apto e sem qualquer restrição médica, senão é certo que não o teria sido admitido, ou esse fato constaria de sua ficha de saúde. Na condição de militar temporário, como é o caso do autor, soldado, é inconteste que o ato de licenciamento previsto no artigo 121, parágrafo 3º, da Lei nº 6.880/80 (Estatuto dos Militares), é discricionário da administração militar.Neste sentido:ADMINISTRATIVO. PESSOAL MILITAR. SERVIÇO MILITAR TEMPORÁRIO. REENGAJAMENTO. EXCEPCIONALIDADE. CONCLUSÃO DO TEMPO DE INCORPORAÇÃO. LICENCIAMENTO. LEGALIDADE.- A jurisprudência deste Tribunal, interpretando a legislação pertinente, tem proclamado o entendimento de que os militares incorporados às forças armadas para prestação de serviços temporários permanecerão no serviço ativo, em regra, durante os prazos previstos na legislação regente, não lhes assistindo o direito de permanência nos quadros do Ministério Militar, por não estarem sob o abrigo da estabilidade assegurada aos militares de carreira.- Expirado o prazo de incorporação, o licenciamento do militar do serviço ativo opera-se por força de lei, sem necessidade de motivação da decisão, pois as razões de conveniência e oportunidade devem ser expendidas na hipótese de reengajamento.- Recurso especial conhecido e provido. (REsp 96637/RJ, Rel. Ministro VICENTE LEAL, SEXTA TURMA, julgado em 12/08/1997, DJ 15/09/1997 p.44461).Entretanto, por ocasião desse licenciamento o militar deve estar gozando de sua plena capacidade física, assim como o estava quando foi recepcionado no serviço militar, devendo o Órgão Militar prestar a assistência médico-hospitalar, em caso contrário, até sua recuperação. É o que preceitua o art. 50, inciso IV, alínea e da Lei 6.880/80 c/c artigos 367 e 431 da Portaria nº 816, de 19 de dezembro de 2003, que instituiu o Regulamento Interno e dos Serviços Gerais nº 51/2003 (RISG) do Ministério da Defesa.Lei 6.880/80:Art. 50. São direitos dos militares(omissis)IV – nas condições ou nas limitações impostas na legislação e regulamentação específicas:(omissis)e) a assistência médico-hospitalar para si e seus dependentes, assim entendida como o conjunto de atividades relacionadas com a prevenção, conservação ou recuperação da saúde, abrangendo serviços profissionais médicos, farmacêuticos e odontológicos, bem como o fornecimento, a aplicação de meios e os cuidados e demais atos médicos e paramédicos necessários;(omissis) Portaria nº 816, de 19 de dezembro de 2003 Art. 431. O militar não estabilizado que, ao término do tempo de serviço militar a que se obrigou ou na data do licenciamento da última turma ou de sua classe, for considerado incapaz temporariamente para o serviço do Exército, em inspeção de saúde, passa à situação de adido à sua unidade, para fins de alimentação, alterações e vencimentos, até que seja emitido um parecer definitivo, quando será licenciado, desincorporado ou reformado, conforme o caso.Art. 367. Adido é a situação especial e transitória do militar que, sem integrar o efetivo de uma OM, está a ela vinculado por ato de autoridade competente.Também neste sentido já decidiu o Superior Tribunal de Justiça.AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. MILITAR TEMPORÁRIO. COMPENSAÇÃO DOS VALORES DEVIDOS COM O MONTANTE PAGO A TÍTULO DE COMPENSAÇÃO PECUNIÁRIA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N.º 211 DESTA CORTE. REINTEGRAÇÃO PARA TRATAMENTO DE SAÚDE. POSSIBILIDADE. INCAPACIDADE TEMPORÁRIA PARA O SERVIÇO DAS FORÇAS ARMADAS.REINTEGRAÇÃO NA QUALIDADE DE ADIDO.1. A alegada compensação dos valores devidos com o montante pago quando foi licenciado não restou debatida e decidida pelo Tribunal a quo, a despeito da oposição dos embargos declaratórios, incidindo o disposto na Súmula n.º 211 desta Corte.2. Os militares temporários do serviço ativo das Forças Armadas têm direito a assistência médico-hospitalar, na condição de Adido, com o fito de garantir-lhe adequado tratamento de incapacidade temporária, o que afasta a suposta ofensa aos arts. 50, inciso IV, alínea a, 108 e 111 da Lei n.º 6.880/80 e arts. 31 da Lei n.º 4.375/64 e arts. 52 e 140, 1.º, do Decreto n.º 57.654/66.3. A mera reintegração de militar temporário na condição de Adido, para tratamento médico, não configura hipótese de estabilidade nos quadros das Forças Armadas.4. Agravo regimental desprovido.(AgRg nos EDcl no Ag 1119154/RS, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 29/04/2010, DJe 24/05/2010)No laudo médico de fls. 247/257, constatou-se que no momento, e em decorrência do tempo relatado de evolução, creio tratar-se de Estado de Estresse Pós Traumático, porém sem destacar a presença concomitante de um quadro de Transtorno de Personalidade Não Especificado (F69) (fls. 253) e, ainda, neste momento, o paciente é incapaz para as atividades militares e civis, posto que sua inadequação e retraimento social, associado a pensamentos reverberantes autorreferentes, impossibilita sua adequada inserção social, inclusive o trabalho produtivo (fls. 253). Ressalte-se que quando o autor entrou no serviço militar gozava de plena saúde, inclusive esta questão é incontroversa e preponderante para que o militar ingresse nas Forças Armadas e se mantenha em atividade, conforme já bem explicitado. Neste sentido, é crucial que quando do licenciamento o autor seja desincorporado nas mesmas condições de quando adentrou, o que não ocorreu no presente caso, razão pela qual faz jus à reintegração. Ademais, no tocante à nulidade da Sindicância de Portaria nº 64510-005206/2013-81 verifico sua ocorrência, em face à violação aos princípios da ampla defesa, liberdade probatória e contraditório. Conforme se pode extrair do processo administrativo carreado aos autos, a partir das 220 (fl. 58 do PA) não consta mais nenhuma intimação para o autor e, ressalte-se, este já havia inclusive constituído advogado naquele processo que inclusive acompanhou a colheita de testemunhos. Desta forma, embora o demandante não tenha sido intimado para apresentar alegações finais às fls. 226 (fl. 64 do PA) foi certificado o decurso do prazo para apresentação de defesa. É certo que o procedimento administrativo deve seguir a regra do processo administrativo que é regulado pela Lei nº 9.784/99, bem se observando o contraditório, a ampla defesa e a liberdade probatória ainda com mais atenção ou de forma mais detida, quando a decisão do procedimento puder causar dano ao administrado, como no presente caso. Por este enfoque, entendo que a partir da colheita dos depoimentos, que se encerrou às fls. 219 (fls. 57 do PA), o processo/sindicância, que culminou com o desligamento antecipado do demandante das Forças Armadas, (fls. 231/232) está eivado de vício, razão pela qual reconheço sua nulidade nestes termos. No que concerne ao pedido de indenização por danos morais, não foi comprovado dolo nem negligência do corpo médico do Exército ao verificar a capacidade do autor para o trabalho. Apenas houve perícias médicas contrastantes no que diz respeito à incapacidade do autor para a vida civil, não revelando a perícia judicial um grosseiro ou evidente erro da administração. Aliás, muito comuns são as divergências de diagnósticos entre profissionais da área médica. Também não há prova da responsabilidade subjetiva dos agentes envolvidos nos fatos aqui tratados.Ante o exposto julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos, resolvendo-lhes o mérito, nos termos do art. 269, I, do Código de Processo Civil, para anular o ato de licenciamento do autor, bem como para condenar a União a reintegra-lo e mantê-lo na condição de adido a partir de seu licenciamento, com todos os direitos a que faz jus, até a reabilitação de sua capacidade total para a vida civil, nos termos do art. 50, inciso IV, alínea e da Lei 6.880/80 c/c artigos 367 e 431 da Portaria nº 816, de 19 de dezembro de 2003, devendo ser bem observada a obrigatoriedade de se oferecer tratamento médico adequado. Verificada a presença da verossimilhança das alegações da parte autora, porquanto procede seu pedido de mérito, bem como da urgência do provimento em face da natureza alimentar e dos cuidados médicos de que necessita o autor, concedo a antecipação, parcial, dos efeitos da tutela. Oficie-se à União para que lance nos registros funcionais do autor a sua reintegração e manutenção na condição de adido na forma da fundamentação, bem como a pagar-lhe os respectivos vencimentos, a partir da data desta sentença, devendo a autoridade administrativa comunicar a este Juízo o cumprimento desta ordem. Com fundamento no artigo 461, 4.º do CPC, imponho ao Réu multa de R$ 300,00 (trezentos reais) por dia de atraso para o caso do descumprimento do prazo retro estabelecido. Condeno ainda a União a pagar os vencimentos em atraso, com todas as vantagens legais, desde a data do ato de licenciamento, corrigidos monetariamente e acrescidos de juros de mora. Os índices de correção monetária serão os constantes da Tabela de Correção Monetária para Condenatória em Geral (Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal – CJF) e os juros, contados da citação, de 0,5% ao mês, a teor do art. 1º-F da Lei n. 9.494/97. 97….”